Foi há quase vinte anos atrás. Mais ou menos uma geração. O Papa João Paulo II fazia então sua última peregrinação a Lourdes. Durante a homilia, por ocasião da Missa de 15 de agosto, que celebra a Assunção da Virgem Maria, ele destacava enfaticamente a missão especial que cabia à mulher: “Ser, na sociedade atual, testemunha dos valores essenciais que só podem ser percebidos com os olhos do coração”. Numa época já bastante marcada pelo materialismo e pela secularização, o Papa polaco disse à multidão, como um profeta: “A vós, mulheres, cabe a vós ser sentinelas do Invisível!” Sentinelas do Invisível. Protetoras de um tesouro. Luzes noturnas que não se apagam. Que concebem, que protegem, que educam. A grandeza das mulheres, sem ofensa às feministas mais radicais, não se mede por seus direitos, mas pelos privilégios de seu coração, um coração que o sexo oposto possui grande e, muitas vezes, generoso. O bom senso popular — ao qual é sempre bom voltar quando os pontos de referência se confundem — não fala acaso da sensibilidade feminina ou da intuição materna? Essa dinâmica de ternura e, ao mesmo tempo, de justiça; essa mistura de capacidade contemplativa e disponibilidade para se dedicar aos outros, diz muito da identidade feminina.
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O desafio atual da condição feminina não reside tanto na defesa exacerbada de seus direitos, mas na afirmação pacífica de sua vocação. Uma vocação para o amor, a doçura e o serviço. A definição do sagrado, oferecida por Gustave Thibon, caberia perfeitamente à mulher: “Aquilo que não ousamos tocar e que, no entanto, nos seduz inteiramente.” Sim, a Igreja ama as mulheres porque sempre viu, no ideal feminino, o lugar adequado do acolhimento e da doação. É entregando-se aos outros, na vida cotidiana, que a mulher realiza a profunda vocação de sua existência. Ela é moldada em profundidade por sua identidade íntima, que faz dela um ambiente propício à doação da vida.
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Querer fazer da mulher um “homem como qualquer outro” significa não somente negar suas diferenças essenciais, mas, de forma ainda mais dramática, insurgir-se contra elas.
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Se a guerra dos sexos consiste em estabelecer uma paridade forçada no mundo profissional, o principal obstáculo da condição feminina reside na negação, ou no encobrimento, daquilo que lhe é antropologicamente específico: a maternidade. O professor Jérôme Lejeune evocou esta prerrogativa indiscutível com espírito poético: “As mulheres sempre souberam que há uma espécie de país subterrâneo, uma espécie de abrigo convexo, com uma luminosidade rubra e um ruído bem ritmado, em que pequenos seres humanos levam uma vida estranha e maravilhosa.”
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Ao colocar nos altares rainhas e princesas, que contiveram ou combateram os excessos de seus maridos ou filhos, a Igreja tem se empenhado em honrar a nobreza de caráter dessas mulheres fortes. Os exemplos são numerosos: Clotilde, que domou Clovis; Matilde, que abrandou o duque da Saxônia; Cunegundes, que participou da santidade de Henrique da Baviera; Branca de Castela, pedra angular da edificação de São Luís; Isabel de Portugal, que perdoou os erros de seu marido Dom Dinis e pacificou seu filho rebelde Afonso. Para completar o quadro, bastaria referir-se à grande antologia que Bento XVI ofereceu em suas audiências de quarta-feira, entre 2010 e 2011, sobre a santidade feminina, de Santa Hildegarda a Teresa d’Ávila, passando por Joana d’Arc e muitas outras.
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A visão cristã da mulher garante que ela seja considerada em seu justo valor. Os progressistas gostariam de tornar as mulheres iguais aos homens, o feminismo se esforça para torná-los rivais. O cristianismo se limita, por sua vez, a cantar a complementaridade dos sexos, na qual se exercitam as virtudes da renúncia e do esquecimento de si, as alegrias da superação e da admiração, os prazeres da transmissão e das trocas. A mulher abranda o homem e o impele a transcender a si mesmo. O homem a protege e oferece-lhe segurança afetiva, ao respeitá-la. Mais do que os direitos das mulheres ou os erros dos homens, seria necessário antes lembrar, a todos, os deveres de cada um: de cortesia e delicadeza, do esquecimento de si e da castidade no amor.
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