[Ettore Gotti Tedeschi, banqueiro e professor universitário, foi nomeado em 2009 por Bento XVI para presidir o Instituto para as Obras de Religião (IOR), o banco do Vaticano. Colaborou na elaboração de Caritas in veritate, a encíclica que afrontava os problemas então recentes da globalização. Por seu trabalho no Banco Santander, conhecia bem os mecanismos da “nova ordem mundial”].
Essa pandemia ofusca um pouco as certezas que depositávamos na ciência e na abordagem científica de sua solução. Se não sabemos o que acontecerá do ponto de vista sanitário, acho que é bastante difícil fazer previsões econômicas.
Mas vamos tentar visualizar melhor o problema. A origem da pandemia é o vírus Covid 19 e sua transmissão. Dizem que esse vírus foi gerado na China graças à ignorância das regras básicas de higiene (em sentido amplo), regras que, entre nós, seriam indispensáveis e obrigatórias. No entanto, há décadas que temos com a China crescentes relações comerciais.
É possível que os organismos internacionais de controle de saúde (OMS) nunca tenham se preocupado com a higiene do país que abastece o mundo ocidental com uma parte enorme de sua produção? Consumo que foi terceirizado para a China porque produzi-los lá, e importá-los, custa muito menos do que produzi-los aqui.
Ninguém nunca se perguntou em que condições esses produtos eram feitos?
Por que é que eles poderiam custar infinitamente menos?
Em que condições higiênicas foram produzidos e em que condições higiênicas viviam os trabalhadores que as produziram?
E ninguém nunca se preocupou em verificar se, além dos produtos que poderíamos ter importado, direta ou indiretamente (por meio de contatos pessoais), não acabaríamos por importar, também, as consequências dessa ausência de regras de higiene?
Mas nem mesmo nos perguntaremos sobre as razões que impuseram um processo de deslocalização tão acelerado, mal concebido e gerenciado?
Na prática, as origens e as causas do fenômeno que permitiu a transmissão global da pandemia ainda não foram investigadas. Se a causa real de um problema tão grande e complexo for desconhecida, não há dúvida de que existe o risco de errar o diagnóstico e, assim, o prognóstico. Mas, acima de tudo, seremos condenados por não saber lidar com os riscos de transmissão de outros vírus.
É um erro atribuir ao Covid a causa da situação atual; o Covid é a conseqüência de outras causas, muito mais distantes no tempo e mais complexas. As causas reais estão na negação das leis naturais, sobretudo aquelas relacionadas à vida e à procriação humana. Foi o colapso intencional dos nascimentos no Ocidente que gerou uma série de efeitos cada vez mais negativos: deslocalização acelerada na China, ligada aos custos de produção muito baixos, fazendo em seguida os ocidentais consumirem cada vez mais. O último efeito é a pandemia, fruto do caos resultante da negação da ordem natural do Criador.
Além disso, é necessário refletir sobre o fato de que essa pandemia da Covid gerou um fenômeno que não é facilmente materializável: o medo. Mas é a decisão do isolamento (lockdown) que gerou e está gerando os efeitos da crise econômica. Antes de tudo, sobre a oferta (sobre a produção de bens e serviços) e, consequentemente, sobre a demanda (consumo), que por sua vez volta a se refletir na oferta, abrindo um ciclo vicioso. Mas esse impacto do lockdown é assimétrico, variável entre as diferentes (e interdependentes) regiões político-econômicas. Pode-se pensar, portanto, em uma grande mudança de paradigma, embora as variáveis envolvidas ainda sejam muitas para permitir previsões. Só podemos imaginar alguns cenários.
Uma coisa um pouco mais provável é o fim do papel dominante que têm tido até agora, especialmente desde 2008, os bancos centrais, os quais inundaram o mundo com liquidez a taxa zero. Esse poder deve retornar aos governos, forçados a intervir diretamente nas soluções necessárias. Essas soluções se referirão obrigatoriamente à economia real, que deve voltar a gerar riqueza.
Isso ocorrerá de acordo com algumas variáveis. As mais importantes são as seguintes: 1. tempo de risco da pandemia; 2. ações tomadas sem tardança na Europa e nos EUA para reequilibrar a economia; 3. guerras comerciais entre as diversas áreas econômicas para aproveitar esta oportunidade competitiva (este é um ponto fundamental); 4. novas alianças geopolíticas; 5. acidentes de percurso (desejados, previstos, imprevistos e imprevisíveis); 6. sorte; 7. intervenção da Providência…
Se a recessão global poderá ou não ser evitada, é uma decorrência desses sete fatores.
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