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[Os parágrafos seguintes abrem o capítulo final do livro do escritor e poeta inglês Hilaire Belloc, As grandes heresias, lançado no Brasil em 2012 pela editora Permanência, em tradução de Antônio Emílio Angueth de Araújo. Belloc, grande amigo de Chesterton, é quase desconhecido no Brasil; pouquíssimas obras suas foram traduzidas para o português].

Chegamos ao grande momento. A Fé está agora na presença não de uma heresia particular como no passado – o arianismo, o maniqueísmo, dos albigenses, dos maometanos – nem está na presença de algum tipo de heresia generalizada, como ocorreu quando enfrentou a revolução protestante trezentos a quatrocentos anos atrás. O inimigo que a Fé tem de enfrentar agora, e que pode ser chamado de “O Ataque Moderno”, é um assalto indiscriminado aos fundamentos da Fé, à própria existência da Fé. E o inimigo que agora avança contra nós está cada vez mais consciente do fato de que não pode haver qualquer neutralidade. As forças que agora se opõem à Fé têm o propósito de destruí-la. A batalha é doravante travada em uma linha divisória bem definida, envolvendo a sobrevivência ou a destruição da Igreja Católica. E toda a sua filosofia, não só uma parte dela.

Sabemos, evidentemente, que a Igreja Católica não pode ser destruída. Porém, o que não sabemos é a extensão da área em que sobreviverá, seu poder de reviver ou o poder do inimigo de fazê-la recuar cada vez mais para suas últimas defesas, até que possa parecer que o anti-Cristo chegou, e a batalha final está para ser decidida. Esse é o momento da luta diante do mundo.

 Para muitos que não nutrem simpatias pelo Catolicismo, que herdaram a velha animosidade protestante contra a Igreja (embora o protestantismo doutrinário esteja agora morto) e que pensam que qualquer ataque à Igreja tenha de ser de uma forma ou de outra uma boa coisa, a luta já se mostra como um ataque vindouro ou atual contra o que chamam “Cristianismo”.

Encontramos pessoas dizendo a todo momento que o movimento bolchevista, por exemplo, é “definitivamente anti-cristão” – “oposto a qualquer forma de cristianismo” – e que tem de ser “resistido por todos os cristãos, independentemente da Igreja particular a que se pertença”, e assim por diante.

Discursos e escritos desse tipo são fúteis, porque não significam nada de definido. Não há essa coisa de uma religião chamada de “Cristianismo” – nunca houve essa religião.

Há, e sempre houve, a Igreja e várias heresias resultantes de uma rejeição de algumas das doutrinas da Igreja por homens que ainda desejam manter o restante de seu ensinamento e moral. Mas nunca houve nem pode haver ou haverá uma religião cristã genérica, professada por homens que aceitem algumas importantes doutrinas centrais, embora concordando em diferir acerca de outras. Sempre houve, desde o início, e sempre haverá a Igreja e heresias várias destinadas a perecer ou, como a dos maometanos, crescer como uma religião separada. De um Cristianismo comum nunca houve e nunca poderá haver uma definição, pois nunca existiu.

 Não há nenhuma doutrina essencial, de modo que, se concordarmos com ela, possamos diferir acerca do restante, por exemplo, aceitar a imortalidade, mas negar a Trindade; um homem dizer-se cristão, embora negue a unidade da Igreja Cristã; dizer-se cristão, embora negue a presença de Jesus Cristo no Santíssimo Sacramento; dizer-se alegremente cristão, embora negue a Encarnação.

 Não! A disputa é entre a Igreja e a anti-Igreja, a Igreja de Deus e o anti-Deus, a Igreja de Cristo e o anti-Cristo.

A verdade fica tão óbvia a cada dia que, em alguns anos, será universalmente aceita. Não classifico o ataque moderno de “anti-Cristo”, embora, no meu coração, acredite que seja o termo verdadeiro para ele: não, não o nomeio assim, porque pareceria exagerado no momento. Mas o nome não importa. Quer chamemos de “O Ataque Moderno, quer de “anti-Cristo”, é tudo a mesma coisa. Há uma questão clara agora entre a manutenção da moral, tradição e autoridade católicas, de um lado, e o esforço ativo de destruí-las, de outro. O ataque moderno não nos tolerará. E tentará nos destruir. Também não podemos tolerá-lo. Temos de tentar destruí-lo como o inimigo totalmente equipado e ardente da Verdade pela qual os homens vivem. O duelo é até a morte.